Diálogo dos Anjos II
- Ei Maleh!
- Opa Miguel, como vai?
- Que está fazendo aqui embaixo? Estamos nos preparativos e você sumiu!
- Fui enviado numa missão surpresa, estou aqui há um tempo observando, vendo como fazer.
- Quem é?
- O senhor de preto no banco pensando.
- Qual a história?
- Parece solitário, um pouco cínico, como a maioria deles nesse tempo, estão pensando que são os donos da história.
Este escreveu outro dia que neste século nenhum humano tem qualquer causa pela qual esteja disposto a morrer, e que essa foi a causa de todos os males e guerras que tiveram, e que disto não tem um pingo de saudosismo. Acho que perturbou nosso Senhor um pouco.
- É, Ele sabe o que faz. O rapaz parece não ter pelo que viver também.
- As vezes tenho pena deles, assim sempre tão distantes, procurando por nós aqui tão perto. Mas as vezes não faz o menor sentido este trabalho.
- Você sabe quanto o Rei fica contente quando um deles ouve, mesmo eles achando que tiveram a iniciativa.
- Sim, tem razão.
- Esse cara deve ter tido uma vida dura, se ele não tem pelo que morrer, nem pelo que viver, qual seria o valor dessa vida?
- Por isso estou aqui. O seu avô fazia parte do partido comunista na Rússia, lutou na revolução, acreditava que isso levaria todo o seu povo à dignidade. Morreu no fronte pela causa em que cria. O seu pai cresceu com sua mãe no interior, e culpava o sistema pela sua perda tão jovem. Depois da Segunda Guerra se mudou para a Alemanha Oriental, e conseguiu fugir do Regime. Se tornou um grande comerciante, se mudou para a América e fez fortuna. Se transformou no inverso do que seu pai havia sido, odiava todas as certezas convictas do comunismo, mas defendia com armas em punho seu dinheiro e o capitalismo americano.Quando seu filho estava com 21 anos, a União Soviética se desfez, sem ter contra o que lutar, com a fortuna feita, e sem maiores objetivos, tirou sua vida com um tiro na garganta. Seu filho, este aí, jurou que esta covardia jamais lhe invadiria. Contudo aí está.
- Mais uma vida desgraçada pela razão. Era melhor quando nosso trabalho era mostrar porque deveriam parar de guerrear.
- A guerra parece ser quem traz a paz, porque só assim eles veem que estamos por perto.
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